quinta-feira, 26 de agosto de 2010

20 agosto de 2010 (by: Marcela Aragão)

Esse texto não é meu, é de uma grande amiga minha que deu ele de presente para o blog. É de uma genialidade sem igual. Tomara que mais desses venham... Valeu Marcelinha!
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Dia desses fui pega de surpresa quando voltava pra casa. Olhos distantes, cabelos ao vento, pensamento suspenso no ar, e de repente a cena. Como eu queria uma câmera, pra registrar aquilo não somente no refúgio da minha mente. Queria poder compartilhar com o mundo, para saber se alguém mais veria o que eu vi. O impacto de uma imagem é muito maior do que o de simples palavras roucas.

Pode parecer bobo, mas o conceito de arte é assim mesmo. Cada um a sente de um jeito, o estranhamento que ela provoca é muito particular. Eu sei o que eu vi, e sei como me senti numa terça-feira qualquer. Senti-me despedaçada, e enxerguei-me naquela mini boneca de pouco mais de seis centímetros.

Largada no sol a pino de uma da tarde, sem nome, sem documento. Deitada de bruços no chão, os cabelos mal tratados, e juro que vi os braços dobrados. Vi uma morta, uma suicida, uma escondida, aterrorizada. Vi uma garotinha desolada no corpo frágil daquela boneca. Quem seria sua dona, sua tutora? Tinha a obrigação de protegê-la, não tinha? Desviei o olhar. Eu não podia continuar invadindo a sua intimidade, tinha que ir embora. A dor daquela bonequinha era densa demais.

Quem disse que precisava ser bonito? Quem disse tinha que ser agradável olhar pra aquela fotografia? Nem sei se ela estava atropelada. Também não sei se sua ausência foi sentida. Teria sido ela descartada? Sequer sei se alguém mais no universo – ou sem exageros, naquela esquina – viu o que vi. Sei que me percebi ainda mais sozinha, ainda mais incompreendida – não tanto quanto ela, é verdade. O que ela pensava? O que eu penso? Tenho medo de uma certeza que me consome: o que eu vejo quase ninguém vê.

Aliás, alguém me vê? Porque atualmente, nem eu me vejo.

OBS: Quando passa um mendigo na rua, com a fome estampada nos gestos e o desespero explícito nos olhos, você nota?

Marcela Aragão

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